quarta-feira, 22 de fevereiro de 2012

Amor?

O filme Amor? do cineasta João Jardim traz vários depoimentos de pessoas, encarnadas pelos atores e atrizes que os representam, sobre suas experiências amorosas. São relatos emocionados e intensos, repletos de descrições de  situações violentas presentes nos relacionamentos. Isto leva o filme a ser intitulado com um ponto interrogação. Será que o que essas pessoas viveram era mesmo amor? Partindo da indagação suscitada pelo filme convido a que façamos algumas reflexões sobre tema tão caro para nós, humanas e humanos.
Na minha experiência como psicoterapeuta, nunca recebi no consultório alguém que trouxesse em sua bagagem de sofrimentos, alguma queixa sobre o amor. É da sua falta, impossibilidade e qualidade precária que as pessoas sofrem. Falam sobretudo da incompreensão, da comunicação falha, da relação ambígua, simbiótica, do ciúme, das incompatibilidades, das traições sofridas ou cometidas, de culpas, de anseios, de paixões, de desencantamentos, de rejeições, de atos violentos, de idealizações, de desconfianças. Todos os amores, maternos, paternos, fraternos, heterossexuais ou homoafetivos podem ser alvo de expectativas frustradas. Passionalidade, frieza, confusão, vinganças, controles excessivos sobre o outro, também compõem as tramas tortuosas do cenário das relações humanas. Na busca pelo amor, especialmente daquele[a] com quem desejamos compor [ou manter] um par, nos desencontramos, inclusive de nós mesmos.
Mas o que é amor?
Experimentamos esse sentimento, pensamos sobre ele e somos também bombardeados por todas as mídias, pela literatura e pelo cinema  com as versões mais variadas que supostamente o representam. O grande guarda-chuva do amor abriga uma composição de virtudes e nobres posturas que certamente incluem gentileza, respeito, empatia, disposição de cuidar do outro e da relação. Em linhas bem gerais, essas qualidades podem estar presentes nos diversos tipos de amor, do apaixonado ao altruísta. Na vida real e prática, para além de qualquer teoria ou discurso, nem sempre encontramos os ingredientes citados, numa boa medida. Resultado? Muitos de nós se tornam analfabetos emocionais crônicos; outros, carentes viscerais que diante da possibilidade de um relacionamento são engolidos pela própria voracidade. Há também os que atacam e enfraquecem seus vínculos mais preciosos porque aprenderam a se relacionar de forma tóxica onde violência e carinho se misturam.

Nem sempre abordar o tema do amor nos leva a caminhos doces e agradáveis.  Exatamente como no filme Amor? na tentativa de desvendarmos o amor, enveredamos por trilhas tortuosas que põe em xeque nossas mais remotas convicções. O encontro com um outro deveria, em tese, suscitar nossa disposição mais exploratória e questionadora. Entrar numa relação amorosa é um exercício de intimidade, de comunicação pessoal consigo mesmo e com os outros. Somar Eu e nós,  como bem postula Edgar Morin, seria uma forma conciliatória e não excludente de se viver um relacionamento.
Num processo de psicoterapia, ao trabalharmos nossas dores de amor mais primitivas e rastrearmos como se construiu nossa forma de amar, nos abrimos para a possibilidade de reverter as situações emocionais que produzem dissabor. A partir daí reinventar outras maneiras de viver o amor  deixa de ser um bicho de sete cabeças. 




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